Pecúnia, artigo do padre Charles Borg

Não se pode servir a Deus e ao dinheiro! A sentença saiu da boca de nosso Senhor Jesus Cristo. Confirma recorrente orientação que perpassa os livros sagrados. Profetas, apóstolos e o próprio Mestre de Nazaré alertam com insistência quanto ao grave perigo de atrelar religião à dinheiro. Chegou a recomendar o Rabi de Nazaré que seus mensageiros viajassem leves, sem duas túnicas, sem bolsa, apenas com sandálias e cajado, na tarefa de levar o evangelho ás nações. Ingenuidade extrema imaginar que instituições religiosas não precisam de dinheiro para sobreviver. Urge, todavia, estabelecer e respeitar prioridades. Bens e dinheiro são ferramentas a serviço da evangelização e nesta condição devem ser mantidos e administrados. Confirma a história das religiões – de todas as confissões – que sempre, quando o aspecto pecuniário passou a ocupar lugar de destaque na preferência e na ação das lideranças religiosas, o testemunho evangélico ficou opaco. Chegou-se a medir o êxito de uma denominação religiosa pela ostentação de seus templos e pelo estilo de vida confortável de seus dirigentes. Uma teologia da prosperidade ganhou manchetes e adeptos!

Sociólogos modernos, residentes particularmente em países de tradicional cultura cristã, apresentam interessantes estudos sobre a vitalidade da religião a partir dos reflexos da pandemia, tendo como ponto de referência a saúde financeira das entidades religiosas. Impedidas de realizar celebrações e cultos presenciais, muitas entidades religiosas sentiram “no bolso” o impacto da pandemia e acabaram literalmente fechando as portas. Sem dízimo, nada de pregação! Alguns grupos ainda tentam se juntar a congregações maiores e mais sólidas financeiramente num esforço para não definhar. Ficou evidente que grupos religiosos – a reflexão se estende também à denominações não-cristãos – que deixaram de oferecer a seus fiéis serviços alternativos de atendimento religioso e suporte espiritual ficaram desacreditadas.

Fiéis naturalmente migraram para outras agremiações religiosas ou simplesmente abandonaram a prática da fé. Em compensação, outras instituições que, mesmo limitadas pela pandemia, se empenharam em encontrar meios de manter seus fiéis alimentados espiritualmente recorrendo às ferramentas oferecidas pelas redes sociais, não somente conservaram sua vitalidade religiosa, como também conseguiram sobreviver financeiramente. O fluxo de contribuições diminuiu, mas não a ponto de impedir a realização de atividades estritamente religiosas e outras de cunho solidário e assistencial. Interessante observar que grupos religiosos que se envolveram em atividades solidárias e humanitárias registraram aumento em número de simpatizantes. Suporte financeiro é natural consequência ao autêntico zelo missionário, facilmente perceptível pela sensibilidade humanitária dos cidadãos.

A pandemia serviu como propícia oportunidade para filtrar que tipo de fermento alimenta intenções e objetivos de grupos religiosos. Fermento pecuniário gera morte, corrompe a própria palavra de Cristo. Fermento divino gera vida, alarga fronteiras. Movidos por autêntico fermento missionário, dirigentes e fiéis foram encontrando meios para manter acesa a chama da fé de suas congregações e abrir novos horizontes de evangelização. Reconhecendo o legitimo esforço missionário, os fiéis não deixaram de oferecer suporte financeiro a suas comunidades. Ajustes e remanejamentos se impuseram, é verdade. Prioridades foram reavaliadas. O essencial, no entanto, foi preservado e, em algumas situações, ampliado. Fermento pecuniário fecha igrejas. Sufoca a fé. Comunidades progridem, financeiramente inclusive, quando o primordial permanece o anuncio e a vivência do Evangelho. Na evangelização, dinheiro é instrumento, nunca condição!

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