Quem a Deus teme não se enxerga apolítico! Entende-se o termo ‘político’ em sentido preciso: o que se refere à vida comunitária. Fazendo eco à doutrina social da Igreja, os bispos norteamericanos, em mensagem enviada aos católicos por ocasião das próximas eleições presidenciais, insistem que o espaço privilegiado do cristão é a praça pública. É no convívio social que o cristão oferece autêntico testemunho de sua condição de discípulo de Jesus Cristo.
É no convívio social que o cristão encontra espaço privilegiado para marcar renovadora presença, guiado pela fidelidade aos valores religiosos. Levando à sério o apelo do Senhor Jesus – buscai primeiro o Reino dos céus e tudo mais vos será acrescentado – o discípulo se distingue pela luta por justiça e dignidade. Favorece todas as iniciativas que legitimamente promovem o ser humano e combate outras que, mesmo disfarçadas, o exploram ou o tornam servilmente dependente. Ato contínuo, alia-se à agentes públicos que trabalham honestamente pela promoção integral do ser humano.
Participar ativamente do processo eleitoral figura-se como evolução natural da condição de crente. Se, de fato, acredita que é chamado a construir uma ordem social justa e digna não somente não se exime de envolver-se no processo político, como também aplica-se em sufragar candidatos que julga estarem honestamente empenhados neste ideal. Vale ressaltar, a esta altura, que a luta por desenvolvimento genuinamente humano não é exclusividade de pessoas ligadas à religião confessional. É possível encontrar pessoas justas que não são filiadas a religião alguma. Como também é perfeitamente possível topar com agentes que se gabam ostensivamente da sua confissão religiosa, mas que praticam uma política rala, corporativista, interesseira.
Entre o candidato que ostensivamente usa a religião como trunfo e um outro com histórico de atitudes e posturas genuinamente justas e dignas, o sujeito temente a Deus intui a quem deve apoiar. Filiação religiosa, por si só, não representa critério consistente para sufrágio. Honestidade e integridade não são privativos de frequentadores de igrejas! Critério outro: o cidadão temente a Deus saberá filtrar perfis.
É próprio do religioso convicto, marcar presença transformadora, embora de forma discreta. A religião preza a humildade. O Senhor Jesus define este tipo de procedimento de maneira magistral quando lembra que o sujeito temente a Deus age como sal, como fermento.
Sua atuação é transformadora, mas sem alarido. Quem é de Deus edifica com o exemplo. Adota com convicção a certeza que a bondade não necessita de ruidosa divulgação. Destaca-se por sua própria vitalidade. O fascinante na prática do sujeito que põe Deus acima de tudo é a capacidade de silenciosamente convencer e prudentemente cativar. À semelhança da luz, atrai e ilumina sem a necessidade de artificial aditivo. A identidade religiosa aparece como que por acaso.
Quando, ao contrário, se dá à identificação religiosa papel de proeminência, a gestão muda de paradigma. Ardilosamente insinua-se uma essencial dependência da confissão religiosa. De maneira sutil, mas progressiva, busca-se impor um credo sobre a coletividade. Ora, religião não se impõe! É próprio de fanáticos pretender impor sobre outros suas convicções, mesmo sendo teoricamente corretas.
Teocracias nunca foram regimes recomendáveis.
A religião não pode se colocar a serviço do poder público, nem este à reboque daquela! A história, com exemplos claros e trágicos, ensina que toda vez que o poder político se identificou e buscou sustentação em dogmas religiosos, as consequências sempre foram desastrosas. É antidemocrático e politicamente danoso identificar religião com governo. Princípios religiosos orientam, nunca patrulham. Educam consciências, nunca coagem. Quem diz pôr Deus acima de tudo, respeita a liberdade de pensamento e abstém-se de patrulhar consciências. Critério outro: cuidado com tutelas religiosas!
Há algo de errado quando o governo faz propaganda da religião e a religião defende o governo!
(continua)