Deus agrega, artigo do padre Charles Borg

Onésimo fugiu! No tempo do Império Romano, um escravo que fugia e fosse capturado recebia, como castigo, a pena capital, normalmente condenado a remar em nau de guerra. Morte certa! O fugitivo Onésimo teve melhor sorte. Encontrou-se com o apóstolo Paulo e a amizade entre ambos culminou em sua conversão e subsequente batismo. Persistiu, contudo, sua condição de escravo fugitivo, punível drasticamente caso fosse denunciado e capturado. O apóstolo entra em cena e decide escrever uma carta para outro seu amigo Filêmon, amo de Onésimo. Esta missiva, a mais curta dos conhecidos escritos do apóstolo, como também a mais pessoal, encontra-se incluída no rol dos textos sagrados. É a razão porque, felizmente, foi preservada.

No texto, o apóstolo apela a seu amigo Filêmon que acolha o ainda escravo Onésimo, “meu filho de coração a quem eu fiz na nascer na prisão”, como irmão querido. Paulo reflete que a transgressão de Onésimo acabou se transformando em grande bênção, pois ocasionou a conversão do escravo para a fé e a subsequente libertação espiritual.

Sim, circunstâncias sinistras podem evoluir em benefícios, reconhecidos apenas com o passar do tempo. Basta exercitar o discernimento e cultivar a paciência. Deus escreve certo por linhas tortas, reza o ditado. A contribuição maior da missiva do apóstolo, reside, no entanto, na reflexão teológica e eclesial que elabora. Mesmo continuando escravo, Onésimo, graças ao batismo, adquire a nova dignidade de irmão na fé! Nas comunidades eclesiais, são muitas e diversas as diferenças entre os integrantes. No entanto, há um denominador comum que iguala os membros.

O batismo eleva a todos à idêntica condição de filhos e filhas de Deus. Em outras cartas, o apóstolo faz alusão a esta realidade quando escreve que na comunidade dos discípulos de Jesus Cristo não impera mais a diferença étnico/religiosa entre judeu e gentio, nem a diferença de gênero entre homem e mulher, e nem a diferença social entre escravo e patrão. Os batizados são todos novas criaturas em Cristo Jesus!

O batismo não elimina as diversidades nem as diferenças, apenas as configura em nova ordem, a semelhança do corpo humano que mesmo possuindo vários membros, todos colaboram para o bem estar do todo. Diferenças e diversidades não são motivos de distanciamentos e discriminações. Ao contrário, são oportunidades preciosas para completar e complementar o bem estar coletivo.

Na atual campanha politica, muito se tem falado de Deus! O Criador e a religião estão sendo citados como chamariz para atrair ou afastar cidadãos, para dividir irmãos que professam a mesma fé, em suma! Absurda contradição! Deus e a religião estão sendo usados, manipulados, para servir a interesses pessoais de poder, profundo desrespeito! Gente há que fala muito em Deus, mas pouco O conhece! Ganhar a eleição é legitima aspiração de cada candidato/candidata, agora reduzir o nome de Deus a instrumento de projeção política é desrespeitosa apelação. Indigência criativa!

O legítimo culto a Deus soma, não divide! A dignidade maior de todos os crentes é sua condição de filhos e filhas de Deus, irmãs e irmãos em Cristo Jesus! A ninguém se dá o direito de dividir o que Deus une! Acima das lidas políticas, Deus agrega e reúne! A fé no Deus-amor, a prática da religião pura, apareceram e prevaleceram a ponto de Filêmon acolher Onésimo como irmão, malgrado as sociais diferenças!

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