Mistério é a pessoa de Jesus Cristo! Assim como tudo que com ele se relaciona. Entende-se a palavra mistério como verdade que ultrapassa o entendimento humano, sem, contudo, o agredir. São verdades que requerem orante reflexão para que se possam ser assimiladas e transformadas em inspiração. Integra o rol de mistérios a solenidade que a Igreja Católica celebra neste domingo: a Assunção ao céu em corpo e alma da Virgem Maria, mãe de nosso Senhor Jesus Cristo.
Segundo antiquíssima tradição – o mistério não está registrado em nenhum livro da Sagrada Bíblia – Maria, por privilégio especial a ela concedido em função da sua singular maternidade, foi acolhida na casa do Pai em corpo e alma. O que está prometido para acontecer no fim dos tempos com todos os seres humanos – a ressurreição dos corpos – em Maria deu-se logo após a sua morte. Emerge a primeira valiosa verdade: o fim último de todo ser humano é participar da glória divina. O ser humano não morre. A morte biológica não representa o fim definitivo da vida humana. O instinto que cada ser humano sente em querer viver para sempre não é ilusório.
Indicativo é que a vida humana não termina, mas persiste em novo e glorioso estágio. Terminada a peregrinação aqui na terra, vive-se a páscoa da eternidade que será complementada quando se der a ressurreição dos corpos. Juntar tesouros no céu não significa viver alienado das realidades terrestres. Ao contrário, quem “busca as coisas do alto”, no correto sentido evangélico, envolve-se com a promoção integral da vida do próximo. Serve a Deus somente quem se dispõe a servir o próximo, como bem testemunha, afinal, a vida da Virgem Maria. Quem acredita na dimensão eterna da existência humana labora incansavelmente para restaurar o cotidiano corrompido.
Salta outro valioso corolário. Ao acreditar no dom sublime que é vida, passa-se, naturalmente, a zelar com todo empenho para que seja preservada e reverenciada. A vida, em especial de cada ser humano, é dom supremo, merecedora de particular cuidado por parte do Criador. Para lhe assegurar sua dignidade, Jesus Cristo, Filho Unigênito de Deus e Filho natural de Maria, ofertou sua própria vida, derramou seu sangue. No atual mundo laico, que se distingue pelas cruéis estratificações sociais, expressar a fé na morte redentora de Cristo, e, consequentemente, na dimensão eterna da existência humana, representa empenhar-se decididamente em favor da vida, em todas as suas etapas como também em todas as suas manifestações. Crer na dimensão eterna da existência significa lutar contra todas as formas de ameaças contra a vida, desde a violência física, social, moral e psicológica.
Emerge particular situação de agressão contra a vida que requer atualmente especial atenção: a covarde violência contra a mulher. A coragem de algumas mulheres ao denunciarem abusos, tanto físicos como psicológicos e morais, revela a preocupante extensão da nefasta e prepotente atitude machista. A reverência que Maria, mãe de Jesus, inspira deve refletir-se na maneira como a sociedade trata as mulheres e as mães. Deus manifestou seu reconhecimento pela cooperação de Maria na obra da salvação premiando-a com a beatificação em corpo e alma. Cabe ao crente entender e traduzir na prática esta sua fé. Em um país que se ufana tanto de sua devoção mariana, torna-se inadmissível este crescente viés de violência contra a mulher!
Ao celebrar os mistérios da fé, o fiel é constantemente interpelado a refletir sobre o impacto da sua crença no varejo da vida. Ao acolher Maria em corpo e alma em sua casa eterna, o Pai reverencia sua maternidade, exalta sua feminilidade, recompensa seu despretensioso despojamento. Aprenda o crente a expressar seu apreço pelo sagrado dom da vida, empenhando todas as suas energias na preservação e promoção da vida, em todas as suas manifestações. A fé na imortalidade do ser humano rechaça toda tentativa de descaso para com a integridade da existência. É no transitório que se vive a dimensão eterna! É no incondicional respeito pela dignidade humana que se alcança a glória eterna!