Padre Charles Borg: Covid-19 e repaginada que a humanidade necessita

Desponta nova normalidade! É de consenso, pelo menos em boa parte da sociedade sóbria, que a rotina, após a turbulência provocada pelo COVID-19, não será a mesma. O forçado isolamento induz a refletir sobre e a reavaliar as preferencias que vinham pautando o comportamento dos cidadãos. Muitas das supostas urgências não passavam de descartáveis contingências. O retiro cívico contribui decisivamente para compreender, igualmente, que a humanidade, como um todo, camufla graves falhas – por atos e omissões – relacionados, principalmente, à desigualdades, descasos e sérias ameaças contra a vida, tanto de humanos como também da natureza, identificada recente como a casa comum.

É-se obrigado a admitir, diante das macabras imagens de milhares de covas coletivas, que ao ignorar a lei fundamental – divina e humana – de respeito pela vida do próximo, as consequências sempre são devastadoras e doídas. Pecados embutem desdobramentos sociais. Reconhecer a responsabilidade abre caminho para a necessária conversão.

Conversão representa cura. E cura exige, não raramente, radicais mudanças de hábitos e de perspectivas. A sequência de restrições e cuidados imposta pelo invisível germe destaca como valor supremo, o apreço pela vida! A vida, entendida em sua dimensão de plenitude e de universalidade, é o bem, não somente a ser defendido, mas a ser promovido. Tarefa esta que recai sobre todos os cidadãos indistintamente. Emerge a falácia de classes, de gêneros, de idades, de nacionalidades.

A humanidade é uma só e intrinsecamente interdependente. Se não são todos a zelar pela vida de todos, a raça naufraga. Emendar-se, então, exige eliminar qualquer justificativa de preconceito e de discriminação. Qualquer pose de arrogante superioridade! Envolve, coerentemente, combater propostas que atentam contra a vida, seja de cidadãos nascituros como de outros mais desamparados e invisíveis. Dói ouvir profissionais de saúde confessar o presente drama enfrentado nas UTIs, ter que escolher quem merece viver!

A vida humana demanda respeito e reverência, qualquer que seja a situação. Como é possível conciliar respeito pela vida e facilitar, simultaneamente, a posse de armas de fogo, cujo inconfessado, mas real, objetivo é atirar para matar. Estranho cristianismo este que patrocina, mesmo indiretamente, agressão contra o semelhante! Salta igualmente à mente e agride o sentimento humanitário a sorte de tantos migrantes e refugiados empurrados de lado a outro, implorando abrigo e espaço decente para sobreviver! Inadiável conversão!

A conversão inclui, necessariamente, o respeito ao meio ambiente, à casa comum! Urge modificar radicalmente a relação com a natureza. O Criador colocou a criação a serviço do ser humano. Dela o ser humano tira seu sustento. Dela também garimpa a matéria prima para produzir remédios. Ao agir como se dono absoluto fosse, ao agredir gananciosamente a natureza, o ser humano reduz drasticamente, em seu próprio prejuízo, a potencialidade da criação de lhe proporcionar vida plena. Sem a reverência pela natureza, a humanidade fica sem comida saudável, sem água potável, sem ar puro para respirar, e sem remédios para curar-se! Total insensatez! Cuidado este que envolve o cidadão comum, responsável direto pelo varejo da poluição!

Abençoado retiro cívico, forçado é verdade, mas oportuno a ponto de fazer emergir uma renovada humanidade, mais humilde, mais reverente, mais zelosa! Que volte a normalidade, repaginada!

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