Kairós, artigo do padre Charles Borg

Oito minutos de silêncio! A praça de São Pedro, no Vaticano, repleta de fiéis, predominantemente jovens vindos de várias partes do mundo, atendeu ao apelo do Papa Francisco na abertura do culto ecumênico em preparação para o Sínodo sobre Sinodalidade ora em curso. Este clima de escuta será a logística a marcar o católico encontro. Recolher-se em silêncio não representa tanto excluir ruídos e cerrar ouvidos à conversação. Silêncio, na prática mística, é abrir mente e coração para ouvir o que o Espírito Santo quer comunicar.

Não há oração transformadora sem a prática do silêncio interior. Sem este encontro profundo consigo mesmo, com Deus e com a realidade que interpela. É a oportunidade concedida ao Espírito para encher a alma de fé, de esperança e de caridade. É preciso, primeiro, esvaziar-se dos fúteis ruídos e das frívolas conversas caso se queira mesmo encher-se da dinâmica presença do Espírito. Com este profético gesto, o Papa Francisco ratifica a metodologia a marcar os trabalhos do Sínodo sobre a Sinodalidade.

O Concílio Vaticano II resgatou a dimensão colegial da Igreja ao redefini-la como povo de Deus a caminho. Em seu sentido etimológico, Igreja lembra uma congregação, assembleia de eleitos. O Batismo garante a todos os fiéis status de membros plenos nesta congregação. A realidade, todavia, tem sido outra. Institucionalizando-se, a Igreja evoluiu-se em organização monárquica, com todo poder de decisão concentrado em ministros masculinos ordenados. O papel destinado a leigos era de mera subordinação e execução.

Os participantes do Concílio Vaticano II empenharem-se em corrigir a distorção, abrindo espaço para uma maior e eficaz participação dos leigos na definição dos rumos da Igreja. A profética inspiração, todavia, encontrou resistências a impactar sua plena realização. Ao ser eleito papa, o cardeal Bergoglio, escolado na rica experiência eclesial do terceiro mundo, onde os leigos, e as leigas, exercem indispensável papel na prática pastoral, assumiu a tarefa de resgatar plenamente a dimensão colegial da Igreja. Em síntese, este é o objetivo principal da realização deste Sínodo, fazer com que os rumos da Igreja, seja no âmbito local como continental, contem com a efetiva participação do maior número de batizados possível. Ouvir antes de decidir! Convencer-se que o Espírito Santo não é exclusividade de ministros ordenados, mas também fala e age nos batizados. O objetivo do Sínodo não é propor uma nova Igreja, mas um novo jeito de ser Igreja.

Compreende-se o receio que envolve processo de tamanha envergadura. Muitos são os clamores. Diversificadas são as abordagens. Uma verdade, contudo, sobressai: o mundo vive momentos difíceis de antagonismos, de sérias crises humanitárias. Neste contexto de aflitivas angústias existenciais, a Igreja se apresenta como uma tenda, disposta a abrigar, sem prévio protocolo alfandegário, os mais diversos transeuntes. Reconhece, humildemente, não possuir prontos remédios para todas as feridas. Quer, contudo, ser sinal de esperança para um mundo novo.

A Igreja de Jesus Cristo reconhece ser sua primordial missão dialogar com o mundo, temperada pelo salutar sal do Evangelho. Sua razão de ser é tornar Cristo presente, conhecido, amado e seguido! Renova sua inabalável fé na presença atuante do Espírito Santo, o grande protagonista deste católico encontro. Ele continua falando à Igrejas. E ela quer ouvir sua voz, sem medos, sem filtros, sem reticências!

Kairós é expressão grega que sinaliza o momento oportuno. Reconhece a Igreja ser este o momento certo para, em compasso de fecunda escuta, questionar-se, com candura e coragem: como ser a Igreja de Jesus Cristo no atual contexto de difusas mudanças de referências?

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