Em 1935 Pio XI, canonizando no mesmo dia estes dois santos, que sofreram a decapitação pela coragem com que defenderam sua fé, os propôs como “dois exemplos de fidelidade aos cristãos da nossa época”. O machado do carrasco, que decepou as suas vidas em 1535, atingiu muitos outros católicos, réus por não haverem aderido ao assim chamado: “Atos de supremacia”, mediante o qual Henrique VIII tinha se proclamado chefe da Igreja nacional inglesa, porque o papa se negara a dar-lhe o divórcio de sua primeira mulher, Catarina, para ele poder desposar Ana Bolena. Os dois santos de hoje são as duas vítimas mais ilustres das pretensões do rei.
João Fisher nasceu em Beverley em 1469, e ordenado padre aos vinte e dois anos, foi, como o amigo Tomás More, homem de grande cultura. Mas à vasta erudição, que fez dele verdadeiro filho de sua época, uniu grande zelo e total abnegação no exercício de seus deveres de bispo da pequena diocese de Rochester, para cuja sede fora eleito em 1504, juntamente com o cargo de Chanceler da universidade de Cambridge. Aceitou serenamente a condenação à morte, que foi executada a 22 de junho de 1535, um mês após sua elevação à dignidade cardinalícia, com a qual Paulo III quis honrá-lo pela sua fidelidade e coragem.
Quinze dias após foi condenado Tomás More, também ele como réu de não ter reconhecido ao rei a pretensa supremacia espiritual. Nascido em Londres em 1477, quando jovem, Tomás queria consagrar-se totalmente a Deus, em mosteiro cartuxo; empreendeu, porém, a carreira legal, subindo ao ápice da notoriedade com a nomeação de chanceler da Inglaterra em 1529. Pai de quatro filhos teve sempre comportamento exemplar. Levantava-se às duas da madrugada para rezar e estudar até às sete, hora em que ia à missa. Nem mesmo uma intimação do rei podia interromper seus exercícios de piedade. Fechado na Torre de Londres, aguardando o processo que ocorreu a 1º de julho de 1535, escreveu O diálogo do conforto contra as tribulacões, uma obra-prima da língua inglesa. Corajoso e tranquilo, sobre o patíbulo, ainda encontrou força de brincar com seu carrasco: “Ajude-me a subir; para descer, deixe por minha conta”. Recitou o Salmo Miserere, pôs uma venda nos olhos e inclinou a cabeça sobre o cepo. Sua cabeça foi exposta sobre um poste, na ponte de Londres, durante um mês; depois a filha predileta, Margarida, evitou que fosse jogada no rio, pagando uma grande soma de resgate. Celebérrima é a sua Utopia. Célebre é também sua Oração para o bom humor.
Extraído do livro:
Um santo para cada dia, de Mario Sgarbossa e Luigi Giovannini.