Orani João, Cardeal Tempesta, O. Cist. – Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro – RJ
No dia 31 de maio, quando a Igreja celebra a festa litúrgica da visitação de Maria a sua prima Isabel, a Arquidiocese do Rio de Janeiro faz memória e celebra com júbilo os 90 anos da proclamação de Nossa Senhora da Conceição Aparecida como padroeira do Brasil, decretada pelo Papa Pio XI no ano anterior a pedido dos arcebispos e bispos brasileiros, junto com o reitor do Santuário de Aparecida e coordenados pelo Cardeal Sebastião Leme, nosso antecessor.
Neste mês de maio em que o Papa nos pediu para rezarmos pelo fim da pandemia, e também aqui no Rio rezamos pela paz, queremos “coroar” Nossa Senhora como é nossa tradição fazê-lo sempre no final do mês de maio, com nossas orações e nossa gratidão.
No dia 16 de julho de 1930, o Papa Pio XI assinou o decreto pontifício que declarou e proclamou Nossa Senhora da Conceição Aparecida Padroeira da Nação Brasileira. Diz o decreto: “Por motu proprio e por conhecimento certo e madura reflexão Nossa, na plenitude do Nosso poder apostólico, pelo teor das presentes letras, constituímos e declaramos a Beatíssima Virgem Maria concebida sem mancha, sob o título de Aparecida, Padroeira principal de todo o Brasil diante de Deus. Concedemos isto para promover o bem espiritual dos fiéis no Brasil e para aumentar cada vez mais a sua devoção à Imaculada Mãe de Deus.”
Por meio de reportagens, crônicas, fotografias e testemunhos, podemos contemplar as maravilhas que a imagem histórica, de cor negra, provocou quando em 1931 “apareceu” no Rio de Janeiro, vinda de trem, de Aparecida, de onde nunca tinha saído desde que foi encontrada pelos pescadores Domingos Garcia, Felipe Pedroso e João Alves, em outubro de 1717, no rio Paraíba do Sul. Saiu na noite anterior de Aparecia e o trem (com o “carro capela”) veio parando em todas as estações do trajeto para as homenagens.
Nossa fé nos leva a acreditar que foi um momento em que o povo brasileiro experimentou a mesma alegria que teve Isabel quando ouviu a saudação de Maria, e semelhante a João Batista, também “saltou de alegria” no “ventre” do coração do Brasil, na época a capital da República. Recebida como a bendita entre as mulheres e os homens, foi um sinal explícito de que Deus continuava fazendo maravilhas.
Para ver a imagem da padroeira, mesmo que fosse de longe, a grande metrópole se transformou. As pessoas saíram de casa para se juntar com as que vieram de todas as partes do país. Enchiam ruas, praças e janelas. Na procissão, mais de 30 bispos, o clero, e a presença expressiva de membros de irmandades e associações religiosas. Também muitas autoridades, inclusive o presidente da época, Getúlio Vargas. Os sinos das igrejas repicavam, os aviões militares cruzavam os céus e o povo não cansava de dar vivas à padroeira. Os testemunhos afirmam que foi um dia luminoso, de emoções, uma antecipação da vida na eternidade.
No dia seguinte ao ato da proclamação, Dom Sebastião Leme escreveu (1): “Vi espraiar-se aos pés do altar de Aparecida a onda humana que na Esplanada se comprimia, mais do que nunca senti orgulho de minha fé, da minha pátria e da minha cidade”.
Na mesma mensagem, Dom Sebastião Leme afirmou que nenhuma cidade do mundo poderia apresentar tal espetáculo, marcada pela espontaneidade e vibração de sua fé: “O Rio de Janeiro foi na aclamação de ontem a voz de toda a terra brasileira. Ato de fé, expressão de confiança, a procissão valeu como um plebiscito nacional, cujo voto proclamou Nossa Senhora da Conceição Aparecida não só como padroeira, mas ainda como Rainha do Brasil. E o voto do povo brasileiro foi tão unânime e ardoroso que explodiu nas chamas de um imenso e portentoso incêndio de corações”.