Elo, artigo do padre Charles Borg

Conquistas inflam o ego! Sucesso gera reputação! Na hodierna cultura, moldada pela rígida lógica de meritocracia, toda forma de êxito fica creditada quase exclusivamente à competência dos notáveis em foco. Como se determinado avanço começasse a partir dos presentes agentes, como se não houvesse passado. Todo progresso é consequência de longo processo de aprendizagem partilhada. Apropriar-se do sucesso como se fosse algo exclusivamente pessoal representa injusto descaso pela contribuição de muitos que aplainaram prévios caminhos. É também grave falta ética para com a coletividade humana.

A dinâmica da meritocracia carrega, obviamente, lado positivo ao instigar o impulso a um legítimo esforço progressista. A ambição, eticamente calibrada, é louvável incentivo. Desprovida, todavia, da disciplina ética e aplicada como único referencial de êxitos, induz a sérios equívocos de avaliação. Alimenta, inclusive, perniciosos instintos de rivalidades e invejas entre agentes que técnica e pragmaticamente devem trabalhar em equipe. Credita-se a esta mentalidade de subjetivo sucesso o exacerbado, e não raramente desleal, espírito de competitividade que muitas vezes corrói saudáveis ambientes comerciais, familiares e até eclesiásticos. Nega-se partilhar valiosas informações para não oferecer vantagens a concorrentes, mesmo ciente de previsíveis avanços benéficos para a sociedade em geral. Flagrante comportamento antiético e antissocial. Rasteira competitividade alimentada, frequentemente, por gordos interesses econômicos.

Emerge, como triste consequência desta mentalidade compulsivamente competitiva, infiltrada nos vários segmentos da sociedade, a diminuição da capacidade para agradecer. E, como corolário, a justa humildade para reconhecer o valor da contribuição de terceiros! Afinal, se o sucesso é devido à esforço puramente pessoal, não há razão para agradecer a quem quer que seja. O petulante personalismo anula, injusta e arbitrariamente, o débito que se tem para com a contribuição de terceiros, menos conspícuos talvez. Em sua presunção, o altivo sujeito esquece que tudo o que ser humano conhece e aprende vem dos outros.

Não existe nenhum autodidata, no sentido justo da realidade. Ninguém alcança sozinho o degrau mais alto do pódio. A mais elementar lição da antropologia atesta que o ser humano figura ser, entre todos os seres vivos, o mais dependente de seu semelhante. Nem capaz de se alimentar, quando infante, por conta própria ele é! Persiste, contudo, em sua insolente soberba! Não é de se admirar que a verdadeira humildade represente a virtude mais difícil de ser praticada pelo ser humano. Afeta diretamente a presunçosa empáfia. Por outro lado, ao reconhecer-se devedor e genuinamente beneficiário de cooperação alheia, o humilde agente cultiva o sentimento de retribuição. A consciência da dependência não o rebaixa, ao contrário o motiva para dedicar-se com mais diligência. Afinal, se se entende premiado pelo esforço alheio nada mais lógico que partilhar graciosa e generosamente as próprias conquistas.

Os sentimentos de gratidão e de generosa partilha se apresentam como valiosos contrapontos humanitários e agregadores ao excludente sistema da meritocracia! O genuíno reconhecimento e o justo sentimento de gratidão promovem a aproximação entre pessoas. Favorecem, naturalmente, a inclusão Beneficiário dos esforços alheios, o agraciado agente divide com alegria suas conquistas, ciente que o compartilhamento generoso contribuirá decisivamente para ulteriores avanços. Largo e feliz é o humilde agraciado! Calculista e contrariado é o convencido celebridade.

Dever e bênção é a gratidão! O débito é por justiça. A retribuição pela ética. É bênção porque situa o ser humano em sua verdadeira dimensão, valioso elo em uma rede de relacionamentos na interdependente corrente humana! Humilde e feliz, o beneficiário agradece!

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